Em 22 de novembro de 2024, quando o prefeito era Gilson Andrade e o seu vice André Graça (atualmente no comando da gestão municipal), foi publicado o Decreto Municipal nº 8.813, que atualizou a planta genérica de valores e as alíquotas para o cálculo do IPTU 2025 em Estância (SE).
A maioria das localidades populares recebeu um reajuste médio de 3,9% — valor próximo à inflação acumulada de 2024, que foi de 4,83%. O bairro Cidade Nova, por exemplo, teve seu valor base elevado de R$ 18,29/m² para R$ 19,03/m², o que pesou no orçamento de famílias de baixa renda.
Segundo dados do IBGE, Estância possui:
- Apenas 18,89% da população formalmente empregada;
E 45,6% da população vive com até meio salário mínimo por pessoa (per capita), conforme levantamento de 2010.
Essa realidade socioeconômica contrasta com o cenário de regiões mais ricas da cidade.
Foto 01: dados Estância (IBGE)
O exemplo mais emblemático é o Condomínio Fazenda Residence II, localizado nas proximidades da praia do Abaís. Com terrenos avaliados em cerca de R$ 80 mil e apartamentos que ultrapassam os R$ 200 mil, o condomínio teve uma redução de 11,6% no valor base do IPTU.
O ambiente oferece estrutura de lazer com piscinas, áreas gourmet, quadras, jardins e segurança, além de acesso facilitado pela Rodovia Ayrton Senna, próximo à Polícia Rodoviária Estadual.
Outro condomínio de alto padrão, o Meridiem, localizado a apenas 13,9 km do Fazenda Residence II, também foi contemplado com a mesma redução de alíquota.
Foto 02: comparativo de aumento
O contraste fica ainda mais evidente quando observamos a situação de outras áreas humildes da cidade, como a Rua Voluntários da Pátria, no bairro Botequim. Assim como na Cidade Nova, o valor do metro quadrado nessa região também foi reajustado em 3,9% de aumento. No entanto, diferente dos condomínios luxuosos, a região é marcada pela baixa infraestrutura urbana, com ruas de paralelepípedo, ausência de calçadas adequadas, saneamento precário e moradias simples.
Foto 03: Rua Voluntário (uma parte) imagem do Google.
As imagens do local falam por si: trata-se de uma área de periferia, com população majoritariamente de baixa renda — e ainda assim impactada pelo aumento. A desigualdade se aprofunda quando comparamos com os bairros privilegiados que receberam redução no imposto, mesmo com alto padrão de moradia e serviços urbanos completo
Para melhor clareza, o valor base é o ponto de partida para o cálculo do IPTU. O aumento citado acima foi aplicado sobre esse valor. Já o valor final do imposto varia conforme outros fatores, como a área construída, tamanho do terreno e uso do imóvel (residencial, comercial, etc.).
Na prática, quanto maior o imposto, menor o poder de compra das famílias — especialmente para quem já vive em situação de vulnerabilidade. No caso dos moradores da Cidade Nova, o impacto é ainda maior: essa cobrança de 2025 é a primeira em toda a história do bairro, o que torna o peso financeiro mais inesperado e difícil de absorve.
Além disso, o próprio decreto revela distorções na aplicação dos valores base mesmo dentro de um único bairro. No caso do Porto D’Areia, por exemplo, o valor do metro quadrado pode variar de R$ 7,53 a R$ 34,77/m², dependendo da área interna em que o imóvel se encontra. Essa variação extrema se dá por causa do chamado Índice de Localização, que vai de 0,50 (áreas menos valorizadas) até 1,00 (áreas de valorização máxima).
Foto 04: valores mesmo bairro
No entanto, mesmo com esse índice previsto em lei, a diferença chega a quase 5 vezes mais entre dois imóveis situados no mesmo bairro. Isso levanta questionamentos sobre como essas zonas foram desenhadas e se refletem de fato a realidade urbana local, já que em muitos casos não há diferença significativa de infraestrutura ou valorização que justifique tal disparidade.
O cenário apresentado em Estância com a aplicação do IPTU 2025 evidencia uma disparidade preocupante na forma como o imposto está sendo cobrado. Enquanto condomínios de alto padrão, com imóveis valorizados e infraestrutura completa, foram beneficiados com redução de alíquota, bairros populares com ruas de barro ou paralelepípedo, ausência de saneamento e moradias simples foram atingidos com aumento. A utilização do índice de localização, embora prevista em decreto, parece desconsiderar a realidade social e urbana vivida por boa parte da população estanciana.
A consequência disso é um imposto que penaliza quem menos pode pagar e protege quem já vive em melhores condições. Famílias que lutam diariamente para sobreviver com menos de um salário mínimo per capita agora precisam arcar com uma nova despesa tributária — em muitos casos, pela primeira vez. Mais do que uma questão técnica, trata-se de justiça fiscal e sensibilidade social, especialmente em um município onde a maioria da população ainda enfrenta dificuldades de acesso a trabalho formal, serviços públicos básicos e oportunidades reais de mobilidade.
por - FACTUAL1
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